março 28, 2005

Estarás comigo no Paraíso...

“Quem acredita em promessa?” Saiu do transe resmungando. Acreditar em promessas é ser tolo. Receber promessas é humilhante. Tolo e humilhado. Abaixou a cabeça, os olhos, fechou-os para que não os vissem ficar vermelhos de raiva. Por que havia sempre de pedir? Se não há escolha, por que sempre temos que pedir? Se já está escrito, por que tinha de ser provado mais uma vez? De repente, todas as suas convicções se esvaíram, como se nunca tivesse de ser humano, falho, corrupto e impotente. Encontrava-se agora diante do eterno questionamento da existência. Por que temos que carregar o instinto da sobrevivência, se não sabemos por que nem para que sobreviver? Por que sempre queremos prolongar a vida se não sabemos qual seu fim? Ninguém sabe o fim. É a busca da satisfação dos prazeres? É a evolução de um espírito que também não sabe para que evolui? Um solitário eremita balança negativamente a cabeça, já que há anos não profere uma só palavra. Um filósofo niilista solta bravatas e heresias, infundadas, vazias. Por que haveria de descansar numa promessa? Cômodo para quem promete, cruel para quem espera. Quem faz promessas não tem a mesma lógica de quem as recebe. Não consola esperar no vazio, se agarrar no desconhecido, no inesperado. Seria como saltar de uma janela vendo a rede que vai te sustentar se afastar em vez de se aproximar dando a impressão de que a queda não tem fim. Como a vida. Sem alvo. Sem objetivo. Achar um sentido para a guerra, se todo guerra é vã. Desde as cavernas, trava-se uma guerra diária. Em vão... Este era o segredo: a vida é um vão. Um lapso. De um lado o crente do outro o cético. Entre eles, a vida. Toda orgulhosa de suas contingências. Certa de que são elas que lhe dão graça e lhe confere seu ar de mistério que tanto o atormentava. Sentiu uma espécie de alívio. Não lhe importava mais apoiar-se no vazio. Aliás, a partir dali, seus vazios ganharam um sentido vivo. Fazia-o sentir cheio de vida. Oco. E completamente, vivo.